Uma
planta usada na medicina tradicional contra o câncer é a nova esperança
de uma terapia mais eficaz contra a Aids. Em desenvolvimento por um
grupo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Laboratório
Kyolab, de Campinas, uma droga se mostrou promissora em testes in vitro e
deve começar a ser testada em animais já no ano que vem. Se os
resultados se mantiverem iguais aos já obtidos, dizem os especialistas,
será uma grande revolução no tratamento da doença.
Especializado
em fitoquímica de medicamentos, o laboratório de Campinas conseguiu
isolar numa planta natural do Piauí uma molécula considerada superativa.
A linha de pesquisa incluía originalmente testar sua atividade contra
alguns tipos de câncer (para os quais já se encontra em fase II de
testes), uma vez que era com esse fim que a planta era usada na medicina
tradicional. Resolveu-se também testá-la contra o HIV.
-
Começamos a estudar suas propriedades contra o HIV e descobrimos coisas
interessantíssimas - afirmou o chefe do Laboratório de Virologia
Molecular do Instituto de Biologia da UFRJ, Amilcar Tanuri.
Vírus se mantém latente em células
Atualmente,
o tratamento padrão contra Aids é feito com o coquetel de drogas. Essa
combinação de medicamentos mantém as pessoas saudáveis porque impede a
replicação do vírus no sangue. Entretanto, se o tratamento for suspenso,
em menos de uma semana o vírus volta a se multiplicar.
Isso
acontece porque, embora as drogas bloqueiem a replicação no sangue, o
vírus consegue se "esconder" no interior de algumas células, onde se
replica muito lentamente, ficando num estado de latência. Mas, quando a
medicação no entorno desparece, ele volta a se multiplicar normalmente,
fazendo com que a doença retorne.
-
A molécula isolada no laboratório de Campinas consegue ativar esse HIV
que está latente. Ela quebra a latência do vírus, que começa a se
multiplicar e sai das células (onde estava "escondido") - explica
Tanuri. - Quando isso acontece, o coquetel consegue eliminá-lo.
Essa
abordagem no desenvolvimento de drogas é inédita. Nos Estados Unidos
vários estudos estariam tentando, ainda sem sucesso, encontrar maneiras
de tirar o HIV da latência.
-
Nenhum medicamento disponível atualmente alcança dentro das células de
latência - explica o diretor do Kyolab, Luiz Pianovsky. - A abordagem é
inédita, superinovadora e pode inclusive vir a ser a cura da Aids,
dependendo ainda de alguns fatores.
De
acordo com os cientistas envolvidos no projeto, mais de 2 milhões de
moléculas já teriam sido testadas em laboratórios internacionais sem
nunca se conseguir achar uma que fosse ativa contra o vírus da Aids.
-
Trata-se de um grande esforço internacional, e tivemos a sorte de ter
uma planta com uma molécula bioativa - comemora Amilcar Tanuri,
acrescentando que o estudo brasileiro está sendo submetido para
publicação no periódico internacional "Aids". - É uma droga-chave para
uma tentativa futura de curar o paciente.
Mesmo
que não se conseguisse a cura total, explicam os cientistas, a droga
poderia ser crucial para suprimir a circulação do vírus no organismo por
muito mais tempo do que os atuais remédios.
-
Não há nada no mundo que atue dessa maneira - ressalta Pianovsky. - Há
alguns produtos para outras funções, mas com potência muito menor do que
essa.
Os
estudos ainda estão em fase inicial e são necessárias ainda várias
etapas de testagem, entre elas a toxicologia. A planta original, de onde
a molécula foi extraída, é extremamente tóxica.
- Os resultados obtidos in vitro, no entanto, já demonstram que a toxicidade não é tão alta - disse Pianovsky.
O
próximo passo dos cientistas é testar o medicamento em macacos rhesus
antes de passar para testes em seres humanos. Ainda há um longo caminho a
percorrer e não há previsão para a finalização da droga. Mas os
especialistas afirmam que, se tudo der certo, seria um dos maiores
avanços em muitos anos.
( Roberta Jansen)
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